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O helicóptero de 41 milhões de reais

A PF confiscou uma aeronave italiana que o advogado Nelson Wilians havia transferido meses atrás para sua mulher

O helicóptero de 41 milhões de reais

De terno, Nelson Wilians atravessa um hangar acompanhado de outro homem. Um vídeo publicado no TikTok em abril mostra a cena. Ele passa diante de um helicóptero verde dos Carabineros de Chile até chegar ao objeto de desejo: um helicóptero da montadora italiana Leonardo, modelo AW169, nas cores branco e azul, de matrícula PS-DNW. As linhas elegantes da fuselagem escondem uma cabine de assentos de couro bege, fones individuais, ar-condicionado de zona dupla e sistema antivibração. O cockpit digital reúne telas largas que exibem informações de voo. Sorridente, o advogado registra com o celular a própria aeronave, com valor estimado em 40 milhões de reais. Em seguida, ergue uma taça de champanhe no interior da cabine, como quem celebra mais um troféu de luxo. 

Há cerca de duas semanas, a aeronave esteve cercada por um contexto menos glamouroso: foi confiscada pela Polícia Federal, na Operação Sem Desconto, que investiga a roubalheira de bilhões de reais contra aposentados e servidores do INSS. Com isso, nenhum plano de voo estará autorizado e deve permanecer no hangar onde está guardada.

A aeronave foi listada pela defesa de Nelson Wilians em uma petição judicial, feita dias depois da apreensão, ao lado de “veículos de luxo, de marcas como Rolls-Royce, Ferrari, Bentley”. O documento pede o desbloqueio das contas bancárias de Wilians, sob o argumento de que apenas a aeronave, avaliada em 41,4 milhões de reais, já seria suficiente para uma possível indenização caso o advogado seja condenado no caso. Ele é investigado* por ter feito pagamentos de 28 milhões de reais para Maurício Camisotti, empresário por trás de três das associações suspeitas de ter fraudado aposentados e pensionistas do INSS (a PF suspeita que que o advogado seja sócio oculto de Camisotti nas associações que operaram os desvios de recursos). 

Como a aeronave vale muito mais que os 28 milhões em questão, o documento fala em “excesso de garantia”. Caberá ao ministro relator do caso no STF, André Mendonça, decidir se aceita ou não.

Há, porém, um dado relevante: o helicóptero não está mais no nome de Wilians.

Em 16 de julho de 2025, a Agência Nacional de Aviação Civil (ANAC) registrou uma “comunicação de venda” do AW169, que passou do escritório Nelson Wilians & Advogados Associados, para a empresa ACW Participações e Investimentos Ltda., que foi aberta em 2019, com capital social de 1 mil reais.  Essa empresa pertence a Anne Caroline Wilians, a esposa de Nelson.

 

Ficou acertado que Anne, única dona da empresa, compraria o helicóptero pelo valor de 39 milhões de reais, a serem pagos em um total de 60 parcelas de 500 mil reais, cada. Pelo contrato, a data de vencimento da primeira parcela era 30 de junho de 2025.

A ACW fez um contrato de “cessão gratuita” para Nelson Wilians.  Ou seja, ele poderia continuar voando, sem pagar por nada. 

A PF investigará se a venda foi uma manobra  para ocultar patrimônio do advogado. 

 

Na decisão em que pediu a busca e apreensão dos bens de Wilians, Mendonça destacou o trecho de uma conclusão da PF:

“A relação entre Nelson Wilians e Maurício Camisotti revela-se além dos limites de uma mera vinculação profissional entre cliente e advogado, uma vez que Nelson Wilians figura como possível beneficiário dos descontos associativos da AMBEC, demonstrava interesse em obter informações acerca da investigação em curso e permanece efetuando repasses financeiros em favor de Maurício. Nesse cenário, apresenta-se como elo de intermediação na circulação de valores provenientes de atividades ilícitas.”

piauí vem questionando Wilians sobre o helicóptero desde a última sexta-feira, mas ele só enviou uma resposta à reportagem após sua publicação, na noite de quarta-feira.

Ele nega que tenha desviado valores. “Reforço que não sou acusado de qualquer desvio.” Segundo ele, esse valor de 28 milhões foi mencionado por outro motivo: “Trata-se dos depósitos que realizei ao Sr. Maurício Camisotti em razão de transações absolutamente legítimas que mantive com ele antes de 2022, dentre as quais se destaca a compra do terreno vizinho à minha residência”.

“Jamais desviei um único centavo. Todas as operações possuem lastro, origem lícita e documentação comprobatória. Isso será devidamente esclarecido e demonstrado, de forma cabal e inequívoca, perante a Justiça”, afirmou à piauí.

Santiago André Schunck, advogado do NWADV, enviou a seguinte nota de esclarecimento:

O advogado Nelson Wilians informa que tem colaborado integralmente com as autoridades competentes e confia plenamente que a apuração comprovará sua total inocência.

Desde o início, Nelson Wilians já deixou claro que sua relação com um dos investigados — seu cliente na esfera jurídica — sempre foi estritamente profissional e legal, fato que será demonstrado de forma inequívoca.

Esclarece, ainda, que não é acusado de qualquer desvio de R$ 28 milhões. O referido valor foi citado em outro contexto: corresponde a depósitos realizados ao Sr. Maurício Camisotti em razão de transações absolutamente legítimas anteriores a 2022, entre as quais se destaca a compra do terreno vizinho à sua residência.

Nelson Wilians reforça que jamais desviou qualquer quantia. Todas as operações financeiras realizadas possuem lastro, origem lícita e documentação comprobatória.

Ressalta-se, por fim, que a medida cumprida tem natureza exclusivamente investigativa, não representando qualquer juízo de culpa ou atribuição de responsabilidade. O advogado permanece à disposição para todos os esclarecimentos necessários e reafirma seu compromisso permanente com a legalidade, a ética e a transparência.

 

Enquanto a Polícia Federal segue analisando os materiais apreendidos na Operação Sem Desconto, a Comissão Parlamentar Mista de Inquérito (CPMI) do INSS virou palco de confrontos mais diretos entre acusação e defesa. Na sessão desta semana, a comissão prendeu em flagrante um depoente — o economista Rubens Oliveira Costa — acusado de falso testemunho, que foi liberado pouco depois.

O foco agora se volta ao depoimento de Antônio Carlos Camilo Antunes, o “Careca do INSS”, marcado para a manhã de 25 de setembro de 2025. Antônio prestou depoimento à PF nesta semana e, em sua fala, negou irregularidades. Segundo a piauí apurou, o “Careca do INSS” afirmou que prestava serviços para associações e que desconhecia irregularidades cometidas por elas. Reconheceu ser dono de uma empresa de telemarketing, mas disse que seu papel era apoiar associados, e não captar filiados de modo ilegal. A linha de defesa mantém o argumento de que delitos, se existirem, teriam sido praticados por outras entidades e não por ele diretamente. Essa deve ser a tônica de seu depoimento nesta quinta-feira, na CPMI.

*A versão inicial do texto dizia erroneamente que Wilians é acusado no caso. Ele é, na verdade, suspeito, como consta na versão atual.

 

 

 

 

fonte 

https://piaui.folha.uol.com.br/o-helicoptero-de-41-milhoes-de-reais/

 

Breno Pires, de Brasília, e João Batista Jr., do Rio de Janeiro

 

 

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